10 de ago. de 2011

Elbow (ou apaixonando-se por um trilha sonora)

Michael Winterbottom é diretor de filmes alternativos e teve seu grande trunfo (ainda que não seja seu filme mais conhecido) com a 24h party people, filme obrigatório na cinemateca do pessoal ligado à música.
Depois de ter assistido 24hours party people em um cinema quase exclusivo, passei a ver todos os filmes do diretor. 9 songs é um filme controverso, na maior parte das vezes odiado, mas com uma trilha sonora (e toda a parte de shows) muito redonda. Foi entre uma cena de sexo explícito e um show do Franz Ferdinand que ouvi Elbow pela primeira vez. A música era Fallen Angels e eu fiquei cantarolando o refrão muito tempo depois de esquecer o filme.
Aparentemente, durante muito tempo ninguém além de mim e Winterbottom conhecíamos a banda (ninguém com acesso a internet e boa vontade para disponibilizar os discos, pelo menos) Mas em 2008 o álbum The Seldom Seen Kid ganhou um Mercury Prize em cima do aclamado (e digitalizado) In Rainbows, do Radiohead. Se isso gerou algum ódio, também deu bastante projeção para a banda. Esse ano, enquanto o Radiohead lançou um disco excessivamente Radiohead, na minha opinião, com um dos clipes mais parodiados do primeiro semestre, o Elbow apareceu com Build a Rocket Boys.
Vindo no meio de The Suburbs (Arcade Fire) e The King of Limbs (Radiohead), Build a Rocket Boys poderia ter passado desapercebido, mas já é fácil ficar preso na guitarrinha repetitiva de The Birds e perceber o quanto o trabalho de voz nesse disco vem primoroso. Lippy Kids é melancolica e leva seus 6 minutos todos apoiados na voz fundo de garrafa Guy Garvey. Em With Love, os instrumentos ganham mais espaço, uma percussão interessante aparece mas, como por todo o disco, é o jogo de vozes que torna a música uma das mais bonitas do primeiro semestre desse ano. Neat Little Rows mostra o lado mais rock da banda, lembrando algo dos seus discos antigos. The Nigth will Always Win retorna as guitarras monótonas e a voz funda para chegar novamente na saudade melancólica que marca o estilo do grupo. High Ideals mistura guitarras e baterias fortes com instrumentos clássicos de corda. The River cria a imagem clara de um rio correndo e das dificuldades do caminho. Open Arms é uma marcha, é linda, cria imagens belíssimas e é um grito de auxílio e de alívio ao peso do disco. Dear Friends volta a ênfase do vocal e encerra com uma despedida e um agradecimento.
Discografia e último disco disponíveis

29 de jul. de 2011

BH music station

Moro em Belo Horizonte há um ano e meio e minha vida noturna aqui costuma ser bem diferente daquela que eu tinha em Fortaleza, por vários motivos. O fato é que durante o primeiro ano na cidade eu conheci bem pouco da música, dos músicos, casas noturnas, djs e produtores de uma cidade famosa por supervalorizar a cultura local.
Pouco depois que cheguei, no verão de 2010, o evento de protesto Praia da Estação era a melhor atração da cidade e lá acabei conhecendo a Graveola e o Lixo Polifônico, banda queridinha da cidade junto com a Dead Lovers Twisted Heart. Aliás, de tão próximas, as duas fazem shows com o nome de Gravelovers e parte de seus integrantes são responsáveis pela excelente e divertida Orquestra Mineira do Brega.
Apesar de gostar de Graveola, sempre tenho a sensação, ao ouvi-los, de que eles esqueceram um pé e uma mão em Recife. Já a Dead Lovers, por uma conspiração universal, eu nunca consegui ver ao vivo. O som deles é bem interessante, mas sinto falta de inovação ali.
Nesse ponto, duas boas surpresas vieram dos "mudernos" que frequentam boates alternativas da cidade. A The Hell's Kitchen Project, dica da Anna, é uma banda sem guitarra que faz um rock'n'roll de primeira e cuida muito bem da própria imagem. O site é super bonitinho, muito fácil de navegar e deixa bem claro a proposta da banda. Vi o trio ao vivo, junto com o Autoramas, e recomendo demais. As letras em inglês me incomodam um pouco, mas a banda tem uma assinatura tão bem definida pelo microfone retrô que esse detalhe se torna quase sem importância.
A outra surpresa (e quando você clicar no play, vai entender que surpresa é uma palavra que cabe muito bem aqui) é o (pré ou pós)punk atonal de experimentos cyber tropicais (palavras deles) da ü. Gato escaldado que sou, se alguém me diz que toca guitarra numa banda de vocal feminino, eu fico esperando um I wannabe Florence and The Machines. A ü passa longe disso, a começar pelo nome compacto e difícil de achar no Google. O primeiro impacto que tive foi uma espécie de soco no estômago. Procurei em todas as minhas referências algo que eu pudesse chamar de parecido: pensei em Tom Zé, Arrigo Barnabé, Mutantes, Sex Pistols e muitas outras coisas, mas nada disso define o som. Para mim, ü é a banda Mário de Andrade gostaria de ter. Em termos de música, acho que é a banda autoral (em português, detalhe importante) que melhor mistura de tudo um pouco e transforma numa música só sua. Os riffs de guitarra são excelentes e o o sax deles parece desde uma buzina de caminhão até um grito agonizante, mas nunca lembra um instrumento de sopro. A bateria e o baixo dão uma linha de coesão que mantém os outros instrumentos todos juntos. Eu não quero comentar o vocal para não estragar a surpresa.
Em Anomia temos um som quase frio, como se estivéssemos ouvindo o som ambiente de uma fábrica fordista. Sólidos começa a mostrar um pouco do barulho que a banda promete, o vocal mostra um pouco do que vai trazer pela frente. Uniformes é um título bem irônico, eu diria. Parece que nenhum dos instrumentos foi gravado junto ou que nem mesmo um músico ouviu a parte do outro antes de escolher o que tocar. E isso fica estranhamente bom. Glamour Nazi dá um espaço maior pra bateria e pro baixo como som e tem a melhor letra também (o que, de novo, dá um lugar excelente pro vocal excêntrico da banda)MGTV é a cor local (porque, ao que parece, estando em Minas, ninguém escapa): o nome é uma referência ao jornal local da Globo e a música podia ser uma releitura (?) do hino extra oficial do estado.
Ainda não conferi os meninos ao vivo, mas se em cima de um palco funcionarem tão bem quanto em estúdio, vale muito a pena tentar.

ps: quebrando a regra do blog, nenhuma dessas bandas tem links de download. É mais para apresentar o que tem de novo no cenário mineiro e vou passando os links à medida que eles forem surgindo.

15 de mai. de 2011

Caetano Veloso - Álbum Branco (1969)


Sentimento de desterro, de inadequação, de saudade. Relação de identidade que só acontece na distância de todos os valores referenciais. Liberdade que aparece nos temas de viagem, risada e mar. Para mim, esse é o Álbum Branco, de Caetano Veloso (que, na verdade, se chama Caetano Veloso)
Ainda que se fale muito no caráter tropicalista deste disco, antropofágico e misturado, eu vejo nele um pedaço grande de Bahia, muito além do sotaque forte que marca todas as vozes das canções. Vejo nele essa parte da identidade que muitas vezes só é encontrada quando se está longe de si.
Para mim essas músicas tem um sabor particular de saudade da infância e de uma série de situações específicas vividas com meu pai. Hoje, o sentimento de inadequação descarado que está em Marinheiro Só e Objeto não Identificado divide espaço com a necessidade de festa do hit Atrás do Trio Elétrico e com os desejos simples como querer "ver Irene dar sua risada".
Pessoalmente, a despeito da nostalgia e das marcas pesadas que acompanham a composição do disco, tão fortes em canções como The Empty Boat e Os Argonautas (um fado belíssimo, por sinal), Caetano Veloso me remete a uma esperança que está lá atrás, acima de todos os maus momentos vividos, na voz do coral infantil, na risada do velho amigo Gilberto Gil, na alegria inerente a Jorge Ben Jor.
Caetano Veloso é aquilo que eu ouço quando acordo sabendo que é dia de começar tudo de novo.

Link para download aqui. A quem tiver oportunidade, recomendo uma audição em vinil.